02 abril 2015

As Veias Abertas da América Latina


O livro é bastante interessante, e você só entende o porquê do titulo, após fazer a leitura da obra, Galeano começa o livro fazendo uma espécie de analise sobre a extrema exploração que os países da América Latina sofreram por conta primeiro do processo de colonização e segundo pelo imperialismo norte-americano, ele nos lembra que “a história do subdesenvolvimento da América Latina integra, como já foi dito, a história do desenvolvimento do capitalismo mundial” p.19 Galeano faz uma descrição da  introdução da America Latina na política neoliberal, onde os países que tem prioridade de receber empréstimos do banco mundial, são aqueles que buscam o controle da natalidade da população, fazendo uma crítica as “missões” estrangeiras que buscam esterilizar os nativos da Amazônia. Diz “Na América latina, é mais higiênico e eficaz matar guerrilheiros no útero do que nas montanhas ou nas ruas”. p. 23

Galeno discute a intensa exploração que América Latina passou durante toda a sua história, deste a chegada dos colonizadores espanhóis, que não pouparam nada nem ninguém na sua busca louca por metais preciosos. Primeiro os índios foram subjugados pelos espanhóis, que trazia uma tecnologia bélica superior a dos índios, além de várias doenças que ceifaram milhares de vidas e da introdução do cavalo que muito espantava os nativos, além de se apropriarem da crença na volta de um Deus (Quetzalcóatl) que voltaria para governar seu povo. Além de utilizar-se de todas essas técnicas mais modernas, Cortez soube fazer alianças com as tribos rivais do império inca, o que foi fundamental para a conquista de Tenochtitlán. Os nativos que sobreviveram foram forçados a trabalhar nas minas em busca de ouro e prata, muitos morreram devido a pesada rotinha de trabalho, a qual não estavam acostumados e principalmente as doenças trazidas pelos homens brancos, alguns cometia suicídio por não suportarem a exploração nas minas. Temos um relato da história da mineração na cidade de Potosí, que atualmente é uma das regiões mais pobres da América devido a intensa exploração que sofreu no passado.

A colonização foi brutal, a população indígena que quando da chegada do colonizador era de 70 a 90 milhões, um século e meio depois passou para 3,5 milhões.  Para ilustrar a desgraça que era trabalhar nas minas em relação a colonização Portuguesa, Galeano nos fala de Vila Rica e Ouro Preto, que apesar da grande quantidade de ouro que era extraída chegava a passar por crises de falta de alimento, já que toda a força de trabalho era direcionada a mineração. Quando se constatou que não era mais possível utilizar da mão de obra indígena, passou-se a empregar a força de trabalho dos negros, vindos da áfrica, que também passavam por condições desumanas, ao ponto de a expectativa de vida dos escravos que trabalhavam nas minas serem de apenas 7 anos.

Outra questão importante é o comercio que Portugal manterá com a Inglaterra, o ouro que era extraído do Brasil ia direto para os ingleses, o que ocasionou a ruína das manufaturas portuguesas, gerando um atraso no processo de industrialização. Ao contrário as riquezas acumuladas com este comércio possibilitaram a Revolução Industrial Inglesa, visto que foi o acumulo primitivo de capital, que permitiu os investimentos na indústria inglesa.

Da “necessidade estrangeira”, ou melhor, da necessidade do mercado, o processo de colonização focou-se também na extração de gêneros agrícola, como o açúcar, café, algodão, borracha. Que foi baseada no sistema de plantação de monocultura de gêneros agrícola, tendo o grande latifúndio como perpetuador desse sistema. O latifúndio açucareiro “destrutivo e avassalador, deixou rochas estéreis, solos lavados, terras erodidas.”

Tanto o Brasil como os países da América Central, passaram por este processo de colonização onde as suas economias ficaram dependentes do mercado internacional, países onde a economia é toda direcionada a produção de gêneros agrícolas, por sinal, muito cobiçados pelos mercados consumidores dos países desenvolvidos, como os Estados Unidos. Temos o exemplo da economia de Cuba, que era baseada na exportação do açúcar e sofria uma grande influência das empresas norte-americana no país, influência tanto econômica como política, o que ocasionou a Revolução Cubana em 1959, que nada mais foi que uma rejeição ao sistema de exploração que estava sendo empregado pelos americanos no país.

O sistema escravista baseado no comercio triangular fez a riqueza das nações européias, até não ser mais adequado as novas exigências do mercado econômico. Foi a Inglaterra um dos beneficiados deste lucrativo mercado de escravos até se torna a primeira nação a proibir o escravismo no oceano atlântico. Já o Brasil substitui a mão de obra negra pela dos emigrantes, visto que a situação desfavorável do escravismo tornava mais barato pagar os emigrantes vindos da Europa que os negros da África. “(...) os cafeicultores, convertidos na nova elite social do Brasil, apontara o lápis e fizeram as contas: eram mais baratos os salários de subsistência do que a compra e a manutenção dos escassos escravos.”

Outro fato que Galeano aborda é a questão do “livre comércio” entre os países desenvolvidos com os subdesenvolvidos, onde os primeiros, de economia forte, se beneficial enormemente em detrimento das economias mais frágeis dos países pobres. “Os países ricos, pregadores do comércio livre, aplicam o mais rígido protecionismo contra os países pobres: convertendo tudo em que tocam em ouro para si e em lata para os demais”.  Temos que as catástrofes naturais convertem-se em bênçãos dos céus para os países produtores, já que eleva o preço dos produtos no mercado mundial.

A fragilidade das economias internas dos países latinos faz com que até os casamentos em “Antióquia” (Colômbia) seja favorecida ou não pela cotação favorável do principal produto de exportação interna (café) na bolsa de Nova Iorque.

As elites locais, dos países da America Latina, donas dos Latifúndios onde “1,5 % dos proprietários agrícolas latino-americanos possui a metade total das terras cultiváveis, e a América Latina gasta, anualmente, mais de US$ 500 milhões para comprar, no estrangeiro, alimentos que poderia produzir sem dificuldade alguma em suas imensas e férteis terras” Estão mais interessados nas questões que lhes beneficiam, sacrificam a economia de seus países aos interesses dos países desenvolvidos, funcionando como simples “instrumentos do capitalismo internacional, prósperas peças da engrenagem mundial que sangrava as colônias e semi-colônias”.

Essas elites locais vendem as suas riquezas, ou melhor, a riqueza de seus países, as empresas estrangeiras, por preços simbólicos, que muitas vezes não representa um por cento do preço final da mercadoria que vai ser gerada com aquela matéria prima, e compra o produto final por preços exorbitantes. A Exploração destas fontes de riqueza naturais, primeiro os gêneros agrícola como cana, café, algodão, látex, salitre, e depois dos preciosos metais do subsolo como o cobre do Chile, o estanho da Bolívia e o petróleo da Venezuela, que tem como objetivo no caso dos Estados Unidos de preservar suas reservas internas, “primeiro devemos usar as riquezas naturais dos outros para depois usarmos as nossas”, é sem duvida a causa do desenvolvimento dos países ricos e a ruína dos países pobres.

A exploração humana e do subsolo ocasionou golpes de Estado, no caso da Argentina onde “os freqüentes golpes de estado na Argentina explodem antes e depois de cada licitação petrolífera”. A busca pelo petróleo é responsável por vários conflitos mundiais na atualidade, é sem duvida um dos bens mais cobiçados pelo mercado mundial, “o petróleo é a riqueza mais monopolizada em todo o sistema capitalista”, o poder gerado por esse recurso natural é capaz de influência nas decisões políticas de muitos países pelo globo, no caso da América. “A Standard Oil e Shell levanta e destroem reis e presidentes, financiam conspirações palacianas e golpes de estado, (...) em todas as comarcas e em todos os idiomas decidem o curso da guerra e da paz”.

Os Estados Unidos são, ao mesmo tempo, os principais produtores e os principais importadores de petróleo no mundo.  Tudo isso devesse a importância estratégica que o produto tem, visto que ganha cada vez mais importância na indústria química e é o material estratégico para as atividades militares.

Na segunda parte do livro, temos uma analise sobre a influência da Inglaterra na economia da América latina. Desde as roupas mais luxuosas dos senhores de engenho até as roupas usadas pelos escravos, tudo tinha origem no mercado inglês, sua influência na economia nacional era forte desde a vinda da família real para o Brasil colônia e dos acordos econômicos em troca da escolta da família real. Esses acordos garantiam que os produtos ingleses fossem menos taxados do que mesmo os que vinham da metrópole portuguesa. O que ocasionava a vinda de mercadorias sem utilidade prática para o Brasil, como patins de esqui na neve por exemplo.

Os ingleses chegaram a influência até a devastadora guerra da Tríplice Aliança ou Guerra do Paraguai, onde um dos poucos países a se desenvolver independente das influências estrangeiras, o Paraguai foi atacado pelo Brasil, Argentina e Uruguai. E um dos casos mais trágicos no qual o Brasil se envolveu, até hoje, o Paraguai não conseguiu se recuperar da Guerra da Tríplice Aliança, “herança de uma guerra de extermínio que se incorporou à história da América Latina como seu capítulo mais infame. (...) O Paraguai se destacava como uma exceção na América Latina: a única nação que o capital estrangeiro não havia deformado”. Um agente norte-americano em viagem pelo Paraguai; em 1845, informava ao seu governo que no Paraguai “não há criança que não saiba ler ou escrever”. p.266-267

Era uma das economias que mais crescia na época sem intervenção do capital estrangeiro, um país sem “mendigo ou ladrões”, quando a guerra começou em 1865 o Paraguai contava com uma linha telegráfica, uma ferrovia, uma boa quantidade de fábricas de material de construção, tecidos, lenços, ponchos, papel, tinta, louça e pólvora, técnicos estrangeiros auxiliavam no desenvolvimento do país. Além de contar com fábricas de canhão, morteiro e balas de todos os calibres, na capital Assunção eram fabricados canhões de bronze, obuses e balas. A economia nacional estava concentrada nas mãos do Estado, ao contrário de outros países da América Latina em que a economia nacional estava nas mãos do capital estrangeiro, a balança comercial mostrava um expressivo superávit. “O Paraguai tinha uma moeda forte e estável, e possuía suficiente riqueza para efetivar enormes investimentos públicos sem recorrer ao capital estrangeiro.” p.268 

A Tríplice Aliança assinou um tratado 10 de maio de 1865, onde já antecipadamente repartia o território do Paraguai entre Brasil e Argentina, o Uruguai mais um fantoche não recebeu nada. O Presidente da Argentina anunciou que tomaria a capital do Paraguai em três meses. “A guerra, contudo, durou cinco anos. Foi uma carnificina, executada ao longo do fortins que defenderam, de tanto em tanto, rio Paraguai. (...) Homens, mulheres, crianças e velhos: todos se bateram como leões. Os prisioneiros feridos arrancavam as ataduras para que não os obrigassem a lutar contra seus irmão.” p.272

Quatro nações engolidas pela guerra, o Paraguai perdeu território e grande parte de sua população. “Os três países [que venceram a guerra a custa de altos empréstimos] experimentaram uma bancarrota financeira que agravou a dependência da Inglaterra”. p.273

No século XX a exploração que era praticada pelos ingleses passa as mãos dos Estados Unidos, que junto do BID e do FMI, deixam a economia dos países latino-americanos refém de juros altíssimos e com planos econômicos que privilegiam o capital e empresas estrangeiras, principalmente, norte-americanos em detrimento da economia nacional desde países. “Em meados do século XIX, o serviço de divida externa já absorvia quase 40 por cento do orçamento do Brasil”. p.280

Em 1964 “A embaixada norte-americana participou diretamente no golpe de Estado que derrubou o governo de João Goulart. (...) O desenvolvimento capitalista já não se compaginava com as grandes mobilizações de massa em torno de caudilhos como Vargas. Era preciso proibir as greves, destruir os sindicados e os partidos, encarcerar, torturar, matar, e apequenar pela violência os salários dos operários, de modo que pudesse ser contida, à custa da maior pobreza dos pobres, a vertigem da inflação”. p.299

Entre 1964 à 1968 as empresas estrangeiras passaram a controlar “40 por cento do mercado de capitais do Brasil, 100 por cento da produção de veículos a motor, 100 por cento da produção de pneus” etc. p. 305 Inclusive a industria de automóveis é uma das que mais lucra pagando salários bem menores do que o que são pagos nas suas matrizes nos países ricos, em suas filiais nos países como Brasil e México pagam salários muito menores do que os da suas sedes na Europa, os incentivos fiscais dos governos locais como doação de terras, tarifas elétricas privilegiadas, isenção de impostos, etc. Que deveriam se somar aos baixos salários para que o produto final fosse mais barato não diminuem o preço desses veículos, que saem com o preço duas, três vezes mais caro do que o mesmo veiculo produzido nas matrizes. p.341  

“Para que a América Latina possa nascer de novo, será preciso derrubar seus donos” p.367

Fonte: GALEANO, Eduardo. As Veias Abertas da América Latina. Porto Alegre, RS: L&PM, 2015.                                       

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe sua opinião, crítica ou sugestão, e ajude-nos a melhorar o Blog Ametista de Clio!