Por Rainer Sousa
Ao
falarmos sobre o século XXI, muitos, logo apontam essa como a era da
tecnologia, da razão e da ampla circulação de conhecimento. Sob tal quadro,
fica difícil imaginar que a figura mítica do demônio tenha espaço na explicação
do mundo ou no próprio imaginário das pessoas. Entretanto, uma recente pesquisa
demonstrou que o número de exorcistas, clérigos responsáveis pela expulsão de
demônios, credenciados pela Igreja Católica, vêm crescendo de forma
impressionante (A imagem ao lado é do manuscrito de Praga, primeira pintura feita sobre o demônio no período medieval)
De
fato, desde que o mundo é mundo, observamos que as culturas ocidentais e
orientais elaboram formas de explicar as mazelas que nos afligem. Nesse
esforço, a construção de uma figura maligna, acaba assumindo os valores morais
e comportamentos de menor prestígio em nossa cultura. Nas religiões cristã,
judaica e islâmica, o mal encarna a figura de um indivíduo que se opõe a Deus e
busca atormentar a vida de todos os seguidores de tais religiões.
Para
muitos especialistas, o desenvolvimento da figura diabólica é fruto das várias
dualidades que permeiam o cotidiano do homem. O belo e o feio, a sorte e o
azar, o certo e o errado, a vida e a morte compõem jogos em que um lado assume
significação positiva e o outro, necessariamente, uma posição completamente
negativa. Dessa forma, não se enganem aqueles que acreditam que o universo
demoníaco seja um traço singular às três religiões anteriormente citadas.
No
século VI a.C., o profeta persa Zoroastro realizou a descrição de um ser
chamado Arimã. Segundo as suas palavras, Arimã era o “príncipe das trevas” e travava
uma eterna luta contra Mazda, o “príncipe da luz”. Segundo historiadores, esse
valor da religiosidade persa acabou sendo incorporado pelos hebreus durante o
famoso Cativeiro da Babilônia. Naquele instante, a interação com a cultura
estrangeira deu origem ao “satan”, termo que em sua tradução literal significa
“acusador” ou “adversário”.
Em
um primeiro momento, o demônio hebraico não assume a postura estritamente
aterrorizante que reconhecemos no cristianismo. Em várias passagens do Velho
Testamento, ele surge como uma espécie de colaborador que recebe a autoridade
divina para punir ou testar os fiéis seguidores de Javé. O sofrimento de Jó,
que perdeu todas as suas terras e ficou adoentado, exemplifica esse tipo de
postura que o demônio assume inicialmente no texto bíblico.
Por
volta do século II a.C. a figura do demônio aparece em alguns textos apócrifos
da tradição religiosa judaica. Se assumir uma feição muito bem definida, os
demônios são apresentados como seres malignos que desorientam os indivíduos e
os levam a cometerem atos deploráveis. No final das contas, o lado mais sombrio
do imaginário religioso judaico esteve concentrado em descrições sobre o fim
dos tempos. A fama do diabo apareceu mais tarde, com o aparecimento da religião
cristã.
Chegando
aos textos do Novo Testamento, autores como São João e São Paulo dedicam linhas
e mais linhas em terríveis batalhas em que o Diabo trava uma intensa guerra
contra Deus. Nesse instante, de criaturas efêmeras e indefinidas, os demônios
passam a fazer parte de uma legião de seres espirituais malignos chefiados por
um líder supremo.
Em uma dessas batalhas, podemos
destacar uma descrição em que Lúcifer e um terço dos anjos são expulsos dos
céus.
No início do cristianismo, vários cristãos acreditavam que o demônio assumia a feição dos gladiadores e leões que os trucidavam nas arenas romanas. Somente no século IV, um concílio na cidade de Toledo descreveu minuciosamente o Diabo como um ser composto por chifres, pele preta ou avermelhada, com rabo e portador de um tridente. A partir de então, os relatos sobre experiências demoníacas ganhavam força em uma nova leva de narrativas.
No início do cristianismo, vários cristãos acreditavam que o demônio assumia a feição dos gladiadores e leões que os trucidavam nas arenas romanas. Somente no século IV, um concílio na cidade de Toledo descreveu minuciosamente o Diabo como um ser composto por chifres, pele preta ou avermelhada, com rabo e portador de um tridente. A partir de então, os relatos sobre experiências demoníacas ganhavam força em uma nova leva de narrativas.
Assim,
a figura do demônio assumia formas e logo seria portador de uma gênese
individualizada. Em 1215, o Concílio de Latrão determinou que o Diabo e os
demônios eram criaturas criadas por Deus que, por conta de suas opções
particulares, preferiram se desviar da autoridade divina. Nesse contexto, ao
mesmo tempo em que o inimigo se tornava claramente reconhecido, outras
histórias falavam sobre pessoas que se entregavam ao temível lado da obscuridão.
De
acordo com pesquisas mais recentes, a disseminação dos cultos aos demônios
surgem justamente no efervescente século XIV. Em alguns países da Europa, a
ordem dos Luciferinos pregava a ideia de que o escolhido de Deus era Lúcifer,
por esse ter sido primordialmente designado como “o anjo de luz”. Na Itália,
uma seita conhecida como “La Vecchia Religione” (A velha religião) organizava
missas onde o pão consagrado era oferecido para os ratos e porcos.
Na
Idade Moderna, o demônio era o maior acusado de conduzir as pessoas a praticar
os atos heréticos combatidos pela Santa Inquisição. Manuais de exorcismo
detalhavam ricamente as manifestações e formas de se expulsar o capeta. Em
vários casos, reforçando o ideal de fragilidade da condição feminina, as
freiras apareciam em público tomadas por demônios, pronunciando várias ofensas
contra Deus e os homens santificados pela Igreja.
Após
o Iluminismo, vemos que a preocupação com o demônio ganha uma ênfase menor
mediante a disseminação das explicações científicas, principalmente no campo
médico. No final do século XIX, a literatura romântica passou a incorporá-lo
como um ser que representa a capacidade de o homem raciocinar livremente. Um
dos mais conhecidos exemplos dessa outra significação aparece na obra “O
Fausto”, escrito pelo alemão Johann Wolfgang Von Goethe.
No
século passado, a relação entre o demônio e o poder de constar padrões acabou
sendo sistematicamente explorado na criação de boatos sobre artistas e
celeridades do campo musical. Em meio à explosão dos meios de comunicação, a
demonização de certos conjuntos musicais e artistas se transformaram em um
caminho certo para a fama, seja ela positiva ou negativa. Afinal de contas,
nada é mais avesso ao diabo que a própria banalização.
Atualmente,
a descrença no diabo acaba alimentando um interessante debate entre os
pensadores da cultura. Para alguns destes, acreditar no diabo é algo
fundamental para que a sociedade reforce os seus limites éticos e morais. Desconstruir
uma imagem do mal pode levar as pessoas a simplesmente ignorarem os
comportamentos hediondos. No fim das contas, acreditar nas forças malignas não
deixa de ser uma forma de reforço às qualidades positivas do indivíduo.
Fonte: http://www.historiadomundo.com.br/curiosidades/a-origem-do-diabo.htm
Fonte da Imagem: http://arturricardo-historiador.blogspot.com.br/
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